Queria saber quem inventou a lembrancinha de aniversário. Imagino que tenha sido o dono de uma fábrica de língua de sogra que, não sabendo o que fazer com o estoque encalhado do produto, resolveu distribuir seu manufaturado às crianças presentes na festa de aniversário do filho. Como o sucesso foi enorme no meio da garotada, a moda pegou e hoje não existe mais aniversário sem a maldita lembrancinha.
Lembro-me de apenas uma festa de aniversário minha que teve "saquinho surpresa". Foi uma festa só para primos, na casa da minha avó. Foi a realização de um desejo porque minha mãe sempre disse que festa tinha que ter comida boa, não "saquinho surpresa". E as de casa, felizmente, tinham. Os salgadinhos da D. Maria, que nos deixava comer coxinha sem fritar porque era feita de frango cozido e os maravilhosos docinhos e bolos da D. Chiquita - gatinho de amendoim, brigadeiro de neguinha, patinho de cocada..., regados a muitos guaranás caçulinhas.
Minhas festas eram em casa, sem recreador, arcos de bexiga, temas comerciais. Festa de aniversário era para brincar, comer, se divertir com amigos. A lembrança era a própria festa.
Fiquei bons anos sem frequentar festas infantis e agora, mãe de dois, vejo que meu desejo de criança não era só meu. Na minha infância eu já queria o "saquinho surpresa" porque alguns faziam e eu achava legal. Hoje a coisa mudou e a lembrancinha está quase mais sacramentada do que o próprio bolo (tem criança que não está muito aí para o bolo, mas para a lembrancinha....). Não ter lembrancinha é ter uma festa pela metade. O cúmulo, para mim, foi ir à festa de aniversário da escola dos meus filhos e a Lalinha, com 3 anos, sair chorando porque na festa não tinha lembrancinha! Ela estava com sono, mas não vou justificar seu desejo no cansaço. Numa outra festa, esta de 70 anos de um tio, as crianças perguntaram da lembrancinha, e o aniversariante, como bom avô, foi atrás de providencia-las. Foi muito legal, mas começo a questionar qual é o valor que a gente passa para os filhos quando se faz uma festa de aniversário, que em tese é para comemorar mais um ano de vida, de conquistas e aprendizados, e o que é mais esperado é o que vai ser dado e não o que vai ser trocado. A lembrança tem sido depositada numa parafernália de guloseimas cheias de açúcar (que em casa vão quase todas para o lixo!) e badulaques que quebram no mesmo dia de uso (com raras exceções que não merecem crédito no momento), e não naquilo que deveria ser a essência da festa de aniversário: o compartilhar. Ela é reflexo da cultura do consumo, do ter que levar alguma coisa concreta para casa, quase sempre industrializada.
Já fiz festa de aniversário dos meus filhos com e sem lembrancinha. Já vi lembrancinhas mais surpreendentes em criatividade e custo do que muitos presentes dados ao aniversariante. De todas as lembrancinhas que vi, as únicas que fazem sentido, são as que são criadas na festa, no meio à brincadeira. Se levar um pedaço da festa é importante para as crianças, que cada um leve seu pratinho com bolo, brigadeiro e salgadinho para comer no café da manhã do dia seguinte, lembrando quão boa estava a festa. É uma lembrança que não enche barriga, enche o coração com a ideia do compartilhar o que foi bom.
Olhando para a geração dos meus filhos, que querem, querem e querem, sem saber por que querem e o que querem, não posso cair mais na ideia de que a lembrancinha é um agradecimento pela presença. Lembrancinha foi instituída por um mercado, e como todo mercado, tem uma força difícil de ser driblada, mas não proibida de ser questionada. Acho que todo mundo devia, antes de pensar na lembrancinha, pensar no sentido da celebração do aniversário. Seria uma lembrancinha tão boa para o mundo...
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