8 de dezembro de 2011

Mãe não é avestruz

Vergonha pouca é bobagem para mãe de filhos entre dois e quatro anos. Sim, porque o terrível dois não acaba com os três anos, ainda mais quando se tem uma taurina em casa (nunca fui muito atrás de astrologia, mas entendi, na prática, que o taurino é touro porque vem com tudo!).

Minha pequena charmosa recebe elogios rasgados na versão gente, mas na versão touro... sai da frente! Tinha parado de bater e chamar as pessoas de “bobinhas”, que, para mim, aos três anos, é xingamento. Ontem, enquanto o médico prescrevia uma receita e ela queria ir para casa, sem a menor cerimônia, levantou a mão e foi mais rápida que minha defesa. Resultado, tomei um tapa sem dó (detalhe, ela tem castigo, mas não apanha dos pais). Hoje, com chuva, programa básico de fim de ano: ver enfeite de Natal em um shopping center, as três da tarde. A dona de madeixas que inveja loiras de plantão, cansada e com sono (mas não se entrega numa soneca depois do almoço) quis um sorvete na hora do lanche. O irmão e a prima seguiram o protocolo de escolher e pesar, mas a enfurecida taurina queria o sorvete sem pesar. Gritou, levantou a mão e me mandou calar a boca quando tentei – calma, educada, mas frustrada – explicar que não podia tomar o sorvete sem pagar.

Não existia buraco para eu me enfiar. A confeitaria lotada, aquele monte de atendente me olhando como se eu fosse um monstro (nessas horas o monstro é a mãe, que não educa) e minha filha gritando (porque a esta altura já tinha me dado outro tapa – ela sempre é mais veloz do que eu!!!!), chamado a plateia de “feias” e me mandado calar a boca. Nunca a mandei calar a boca e se eu tivesse feito isso há quase quarenta anos atrás eu teria tomado da minha mãe um safanão na boca.

Buraco não tinha. A conta ainda precisava ser paga. Eu tinha mais duas crianças e minha mãe. A vergonha tomara outra dimensão, aquela que anestesia corpo e mente, paralisando qualquer sentimento e ação. Sentei-me, sobrevivi a todos os olhares fuzilantes; ouvi uma palavra amiga da senhora da mesa ao lado: “Tive cinco, deixa, uma hora passa”.

Minha tourinha pediu colo. Abracei-a, seguindo a mesma atitude dos seus momentos de birra por cansaço. Lalinha foi voltando a forma gente. A anestesia foi perdendo seu efeito e comentei com minha mãe que tive vontade de deixa-la gritando em frente ao balcão do sorvete, longe de onde estávamos, mas que eu não podia: “Vá que alguém resolve leva-la”. A neta mais velha não teve dúvida e disse: “Mas quem iria querer levar uma menina birrenta?”. Será que na próxima eu posso fazer o que já fiz muitas vezes de deixar chorar até se acalmar e só aí eu voltar? Ai que vontade!

25 de novembro de 2011

Dente de Leite

Escovo os dentes dos meus filhos todas as noites - minha revisão é sagrada - e eu não havia percebido que um dos incisivos do RoRo estava ficando molinho. Um dia, comendo um tolete de palmito em conserva, o RoRo dá um grito dizendo que o palmito tinha machucado seu dente porque estava muito duro. Achei estranho, cortei o tolete em rodelas. Estava macio, mas a região do dente sangrava. Depois que virei mãe encaro sangue, finjo que sou durona ao ver machucado, mas sou daquelas patifes que fecha os olhos quando vê a agulha de uma injeção.

Um pouco mais aflita do que o RoRo, liguei para a dentista. Como um palmito podia causar tamanho estrago? Nem passou pela minha cabeça que, com 5 anos e meio, o dente de leite pudesse estar mole. Para mim, dente só caía depois dos sete!

E patife que sou, lá fui eu na dentista para me preparar emocionalmente para a queda do primeiro dente do RoRo (muito mais eu do que ele!). O dente mole não era trauma causado pelo palmito mole; era só mais um sinalzinho de crescimento  do meu garoto. Foi um bom momento para tirar todas as nossas dúvidas, dar uma pausa para a ansiedade do novo com sangue!

Exercícios diários para o dente amolecer não foram suficientes para o primeiro dentinho cair naturalmente. O permanente que vinha embaixo rasgou a gengiva apontando feliz da vida atrás do dente que estava com preguiça de amolecer para valer. Resultado, extração na cadeira da dentista. Santa Giselle! Livrei-me do primeiro fio dental amarrado no dente e na maçaneta da porta (até hoje não sei se isso é real ou fantasia, mas que isso acontecia quando eu era criança, acontecia!) ou do lenço de pano, que nem tenho, para com muita força e coragem dar aquele puxão que manchava o lenço branco de vermelho. Pânico de sangue; pânico de anestesia de dentista, que na única vez que meus pais viajaram sozinhos quando éramos crianças, meu irmão teve um problema qualquer no dente e tomou infinitas anestesias que não pegaram. Lembro-me dele chorar e não queria que o RoRo sofresse daquela maneira. Santa Giselle, mais uma vez, que com uma habilidade incrível foi conversando com o RoRo enquanto o anestesiava, que me deixou em dúvida sobre o quanto tudo aquilo era história ou estória. O fato é que nem o RoRo, nem eu, percebemos o dente ser extraído. Logo veio o picolé de uva, o dentinho e o alívio, de ambas as partes (ele também tinha seus temores de como e quando aquele dente ia cair).

Fiquei em dúvida se a Fada do Dente passaria em casa ou não. Com quase 6 anos começo a achar meio sem sentido cultivar as figuras fictícias. Na dúvida, ela não passou. Claro que dois dias depois meu banguelinha queria saber por que a  Fada do Dente não tinha passado em casa. Eu tinha a resposta-desculpa: o dente estava guardado no "Livro Porta Dentinhos de Leite" (presente da Santa Giselle no dia seguinte da história do palmito) e uma vez lá, a fada não teria como pegá-lo. Como tudo, a fadinha foi esquecida...

O dentinho vizinho estava começando a ficar mole. Achei que este lance de cair dente era meio efeito dominó - cai o primeiro, dias depois o segundo, o terceiro e por aí vai. Mas não foi bem assim. O vizinho não amoleceu muito, não apareceu dente rasgando a gengiva atrás, desencanei. E quando isso aconteceu, lá começou o vizinho a  reclamar a cada  mordida em uma comida mais dura, com choro, perguntas e muitos temores que rondaram no capítulo "primeiro dentinho". "E se cair na escola?". A professora guarda, cuida, põe gelinho. E a mãe, pensei, fica livre do segundo! Mas para quê pensar nisto? O debaixo está sossegado no canto dele; o molinho ainda não está pendurado, tem tempo... Antes do Natal não cai. Quem disse?

Fada existe. Ela, quando a gente menos espera, aparece para dizer oi.

Hoje, no meio da correria da criançada em casa (eram cinco crianças), o RoRo vem gritando: "Mamãe, mamãe, mamãe... Meu dente caiu quando eu vesti a camiseta! Eu mordi a camiseta e ele caiu!" Ele estava feliz, radiante com o segundo dentinho na mão, limpíssimo. Olhei a gengiva, mal tinha um ponto vermelho. Mais uma vez escapei! Ufa!

Na hora pensei na Fada daquele dentinho, que hoje faria aniversário e estaria dando risada se estivesse compartilhando a alegria e o entusiasmo da criança que ela mais adorava - não que não adorasse os outros, mas o RoRo era especial para ela, e ela, muito especial para ele. Saudades da tia Tila. Seu último aniversário foi em casa, com as crianças que ela adorava. Meu bolo era capaz de arrancar dente, o pior que já fiz, mas a alegria de estar cercada das crianças foi grande. Foi sua despedida, assim, meio de surpresa, como o dentinho que parece que vai cair mas não cai. Mas quando chega a hora, ninguém segura.

21 de novembro de 2011

Quero ser menino!

A famosa "inveja do pênis" descrita por Freud não é assunto de livro. Há algumas semanas a Lalinha vem dizendo que quer ser menino. Quando questionada sobre o por quê de querer ser menino, nunca deu muita explicação. Um dia a vejo em frente ao vaso sanitário, em pé, tentando fazer xixi como menino. Quando me viu, chorou: "Quero ser menino! Quero fazer xixi em pé!". Como se a potência viesse daí... Mal sabe ela que mesmo fazendo xixi sentada ela já tem uma determinação que muito marmanjo que faz xixi em pé não tem idéia do que é... Enquanto ela descobre sua potência, viva o xixi no ralo!

4 de novembro de 2011

Filho crescido...

Sempre ouvi a frase "Filho crescido, trabalho dobrado". Recentemente ouvi uma que gostei mais: "Filho é igual a game, a fase seguinte é sempre mais difícil!".

2 de novembro de 2011

Como nasce um comerciante

Na escola, o RoRo aprendeu a confeccionar envelope de papel. O gosto pela transformação do sulfite retangular em um quadrado, e deste num envelope, tem consumido boa parte do seu tempo.

Hoje, feriado, saindo para um passeio com a família, ele falou: "Tive uma ideia!". Mais uma entre as inúmeras ideias que tem todos os dias: "Ao invés de pedir moeda para o vovô, a vovó, a tia Bia... para colocar no cofrinho, a gente pode fazer envelope, dar para eles o envelope e eles dão uma moeda. Assim, a gente não precisa mais pedir moeda; eles dão moeda no lugar do envelope".

Dissemos que aquela era uma boa ideia e ele questionou: "Mas onde a gente coloca o envelope?". Indaguei: "Como assim?". E a resposta já estava pronta: "Ah, lá no zero!". Ele percebeu que não podia se restringir apenas aos poucos adultos da família que contribuem com seu cofrinho. Ele precisava de mais gente e sabe que onde tem a maior circulação de pessoas no prédio onde moramos é no zero, o térreo.

Fui tomada pela felicidade de estar junto de mais um momento de descoberta do meu filho. Ele descobria, por si só, a relação produto-destino, compra-venda. Plantamos mais uma sementinha do conceito trabalho-remuneração-poupança.

Rapidamente vieram cenas da minha infância onde, com uma mesinha em frente ao portão de casa, eu tentava vender bala, maçã, sabonete pintado e pulseira feita com fio de telefone. Eu tinha 7-8 anos, me divertia com a brincadeira e não virei comerciante. Talvez meu filho vire, ou apenas se divirta em transformar papéis em envelopes coloridos com seus desenhos e escrito seu nome no remetente de algum destinatário que gosta muito.

23 de outubro de 2011

Agora não é depois

A Lalinha estava toda tagarela sentada na privada do banheiro do restaurante. Honestamente, para mim, não era o lugar mais agradável de estar, ainda mais com comida esperando na mesa.

Pergunto:

- "Acabou?"

- "Ainda não, depois."

E o papo corre solto. O tempo também.

Outra vez pergunto:

- "Acabou?"

- "Agora não é depois."

Engoli minha língua e esperei depois chegar ouvindo suas observação daquele ambiente.

20 de outubro de 2011

Um pouquinho sobre brinquedo e consumo

O Dia das Crianças passou e uma série de matérias sobre o consumo infantil foram publicadas em decorrência da enxurrada de publicidade dirigida a este público. Confesso que fiquei estonteada com o volume de informações que os comerciais do Discovery Kids veicularam em sua programação próximo à data (falo do Discovery Kids porque este é o canal mais assistido em casa). Não que no dia a dia isto não aconteça, mas nos dias que antecederam o 15 de Outubro não tínhamos tempo de assimilar uma propaganda que outra já saltava da tela. Não tinham as "chamadas educativas" do canal, que fazem o intervalo um pouco mais leve (mesmo que muitos deles sejam patrocinados por empresas que focam o consumo infantil, o conteúdo não é apelativo e bombástico, que despeja um monte de informação acelerada em alguns poucos segundos). Fico imaginando isso na cabeça de uma criança que ainda não tem capacidade de julgamento. Só dá tempo de, na mesma velocidade, dizer: "eu quero, eu quero, eu quero, eu quero, eu quero". Ou, que significa a mesma coisa: "Compra esse? Compra esse? Compra esse? Compra esse? Compra esse?" (ainda que em casa vem na forma de interrogação porque já sabem que nem tudo a gente compra, bem diferente da maioria, que vem com uma baita exclamação no final!).

Em dois meses teremos o Natal e, diante da avalanche de novos e velhos produtos destinados ao público infantil, enfrentaremos outra vez o dilema do que fazer com a compulsão ao consumo que é despertada e/ou aguçada na criança especialmente nas datas comerciais.

Conter o desejo de consumo fica mais difícil nos indivíduos e famílias onde consumir é o principal lazer e a ideia de ter sobrepõe-se a ideia de ser. Indo mais longe um pouco, consumir pode ser a maneira encontrada para suprir, quase sempre inconscientemente, o vazio existencial.

Por que, no caso da criança, não preencher o que falta com carinho, afeto, companheirismo, compreensão? Porque isso tudo não se pega em uma prateleira, precisa ser construído diariamente e, portanto, dá um trabalho danado. O velho ditado "cada um dá o que tem" cabe muito bem aqui. Quem consegue de fato preencher as lacunas emocionais da criança (e, antes de mais nada as suas próprias) consegue dar o que a criança precisa e, consequentemente, sua necessidade de consumo material diminui. O apelo ao novo brinquedo passa a ser uma frase que evapora como água em dia quente. A criança esquece o que viu e não passa o dia inteiro martelando seu querer.

Não sou radical em achar que criança não deve ganhar presentes ou que brinquedos só tem valor se forem construídos pela ou com a criança. Sou contra o consumo exagerado e a substituição da qualidade da relação que se tem com a criança pelo consumo de qualquer natureza.

Qualquer um que parar e pensar nas coisas boas da infância vai fazer referência a experiências e pessoas. Um brinquedo pode até ser um meio para isso, mas nunca o viés principal. Se analisarmos o que faz uma criança feliz também veremos que não é um brinquedo, mas experiências que envolvem pessoas. Mas, como proporcionar simples e bons momentos com crianças se nós adultos também estamos mergulhados na cultura do caminho mais curto e da auto-satisfação? Entre jogar bola com uma criança ou jogar um jogo eletrônico, entre fazer um bolo em casa ou abrir um pacotinho já pronto, entre usar tinta ou colar uma cartela de adesivos numa folha de papel, entre ir na esquina de carro ou a pé, entre fazer um bolinho com amigos para comemorar o aniversário ou contratar um super buffet, entre passar esmalte na unha da filha ou leva-la ao cabelereiro para ter um dia de princesa, entre fazer piquenique num parque ou lanchar numa lanchonete, entre trazer amigos para brincar em casa ou se encontrar na rua, entre construir um castelo com blocos de montar e revistas ou ter um que não se transforma em mais nada, entre brincar com um boneco multicoisas ou um boneco que vem com frase pronta, qual a sua escolha? A sua é também a do seu filho ou da criança que você cuida.

Não importa o tempo que os pais têm com os filhos, não importa o tempo que eles ficam na escola, em atividades extra curriculares ou com babás. Qualquer um que esteja com uma criança precisa propiciar-lhe experiências criativas e afetivas. Se os pais, as escolas, os cuidadores não conseguem isto, esta criança está fadada a querer tudo o que vê pela frente, sem limite, sem compreensão de que não precisa o que o comercial de TV anuncia.

Um bom brinquedo é aquele com o qual a criança é capaz de viver experiências afetivas e criativas. Pensemos nas bonecas. Elas não precisam falar, andar e comer de verdade. Uma boneca que engatinha, só engatinha; a que fala, só fala as frases programadas. Para uma boa brincadeira basta uma boneca sem características específicas porque com ela é a criança quem determina as características que deseja que a boneca tenha. As bonecas com características específicas chamam a atenção da criança num primeiro momento pois, como não são capazes de proporcionar uma brincadeira criativa, logo são postas de escanteio. Mais um brinquedo para guardar. Mais dinheiro que podia ser poupado.

Antes de comprar um novo brinquedo é importante refletir quais são os brinquedos que a criança realmente brinca e quais são deixados de lado. O que cada um deles propicia e agrega no desenvolvimento da criança? O mesmo vale para roupas, alimentos, lazer. Uma roupa não deve ser comprada só porque a criança quer ou a mãe acha bonita. Quantas vezes a criança vai usar aquela roupa? Ela é confortável, apropriada para a idade, para o clima? A comida que se compra é a mais fácil de se comer ou a mais saudável? O passeio é para a criança ou para o adulto? Consumir é uma questão de princípios, valores e condição emocional. Por isto, tenho um pouco de dúvida do quanto a publicidade em si é a grande vilã da história. Quando o núcleo familiar é coerente e firme com seus valores a publicidade perde sua força em seu objetivo de inundar nossa alma com o desejo de ter. A família consegue bancar suas decisões e a criança, segura em seu porto, consegue entender, mesmo bem pequena, que nem tudo que é anunciado é necessário ou vale à pena ter. Mais do que lutar contra a publicidade, devemos lutar contra nossa tendência de acomodação, de conforto, de busca pelo caminho mais curto. Se educamos crianças, temos a obrigação do diálogo, do questionamento e da reflexão, inclusive sobre o consumo. Consumo consciente hoje é atitude consciente amanhã. Atitude consciente hoje é um mundo melhor amanhã.

17 de outubro de 2011

Por que o cachorro entrou na igreja?

Esta é uma charadinha que a Naná, minha sobrinha de 8 anos, fez com meus filhos. A Lalinha, com seus 3 anos, não teve dúvida em responder usando seu próprio repertório de que igreja é lugar de casamento entre pessoas de sexo oposto: "Porque ele foi casar com o cachorro menina".

Todos rimos muito e o RoRo, com 5 anos, entendeu a brincadeira e a resposta "certa" ensinada pela prima: "Porque a porta da igreja estava aberta!". Cada idade, a sua compreensão.

10 de outubro de 2011

Xuxa ou Sandra Peres?

Voltando da escola com meus filhos e um amigo do RoRo, a conversa foi rolando em meio à frase do meu filho: “Eu odeio a Xuxa”. O amigo completou: “Minha mãe também odeia a Xuxa; ela fala que tem muita propaganda de brinquedo da Xuxa. Eu odeio a Xuxa (...). A Tereza e a Helena (amigas da escola) têm o computador da Xuxa e elas disseram que as mães delas também odeiam a Xuxa”. Em simples coro de repeteco, os três vieram rindo no carro com a frase “Eu odeio a Xuxa”. Ouvi e só falei que, além de brinquedo, a Xuxa, quando as mães eram crianças, tinha uma programa na TV. Não entrei na história de a Xuxa ser totalmente sem graça e cantar músicas imbecis que só faziam a criança pular sem estimular nenhum vocabulário, imaginação e brincadeira. Ela não merece maior apresentação. Melhor que continuem achando que a Xuxa é apenas uma figura carimbada em alguns brinquedos e em um parque de diversões, e não a Rainha dos Baixinhos e criadora do sonho de ser Paquita. Se foi rainha, foi porque não tinha tanta gente fazendo continuamente boa música para criança como tem hoje.

O assunto Xuxa se encerrou antes mesmo de chegarmos em casa. Depois do almoço a Lalinha quis brincar com as primas, Kicoca e Dororoca. Cada uma com uma boneca, começaram a conversar quem seria quem na brincadeira. A Lalinha disse “Eu vou ser a Sandra Peres”. Não, disse a Kikoca, “Eu vou ser a mãe da Sandra Peres bebê”. “ Não, você vai ser a vó da Sandra Peres bebê”. E por aí foram tentando definir quem seria quem. Felizmente, para minha alegria e esperança, não queriam ser a Xuxa. Queriam ser alguém que o mundo mirim e adulto admira pela sua expressividade, criatividade, inteligência e respeito à infância. Queriam ser alguém que é simplesmente gente e encanta com palavras cantadas.

Ainda bem que a monarquia acabou. Viva a democracia musical infantil. Viva a possibilidade saudável de identificação.

4 de outubro de 2011

Bolo de abóbora com côco

Não é só o chocolate que faz um bom bolo. Para criança avessa a experimentar coisas novas, que tal começar com bolos que levam ingredientes diferentes e saudáveis?

350g de abóbora (para doce) cozida em 1/2 xícara de água. Quando a abóbora estiver bem molinha e fria, bater no liquidificador com:
3 ovos
2/3 xícara de óleo

Em uma tigela, colocar:
1 3/4 xícara de açúcar (de preferência demerara)
1 3/4 xícara de farinha de trigo peneirada
1/4 xícara de aveia em flocos
1/2 xícara de coco ralado

Acrescentar lentamente aos ingredientes secos a mistura batida no liquidificador. Por último, adicionar 1 colher de sopa de fermento em pó.

Colocar em fôrma untada com manteiga e farinha e assar em forno pré aquecido 180°C.

3 de outubro de 2011

Sei que estou sendo uma boa mãe...

... quando os olhos dos meus filhos brilham de alegria, tranquilidade, realização, conforto, não porque ganham um brinquedo novo, mas porque o carinho que recebem transforma as coisas simples e banais em grandiosas.

27 de setembro de 2011

Lembrancinha de aniversário

Queria saber quem inventou a lembrancinha de aniversário. Imagino que tenha sido o dono de uma fábrica de língua de sogra que, não sabendo o que fazer com o estoque encalhado do produto, resolveu distribuir seu manufaturado às crianças presentes na festa de aniversário do filho. Como o sucesso foi enorme no meio da garotada, a moda pegou e hoje não existe mais aniversário sem a maldita lembrancinha.

Lembro-me de apenas uma festa de aniversário minha que teve "saquinho surpresa". Foi uma festa só para primos, na casa da minha avó. Foi a realização de um desejo porque minha mãe sempre disse que festa tinha que ter comida boa, não "saquinho surpresa". E as de casa, felizmente, tinham. Os salgadinhos da D. Maria, que nos deixava comer coxinha sem fritar porque era feita de frango cozido e os maravilhosos docinhos e bolos da D. Chiquita - gatinho de amendoim, brigadeiro de neguinha, patinho de cocada..., regados a muitos guaranás caçulinhas.

Minhas festas eram em casa, sem recreador, arcos de bexiga, temas comerciais. Festa de aniversário era para brincar, comer, se divertir com amigos. A lembrança era a própria festa.

Fiquei bons anos sem frequentar festas infantis e agora, mãe de dois, vejo que meu desejo de criança não era só meu. Na minha infância eu já queria o "saquinho surpresa" porque alguns faziam e eu achava legal. Hoje a coisa mudou e a lembrancinha está quase mais sacramentada do que o próprio bolo (tem criança que não está muito aí para o bolo, mas para a lembrancinha....). Não ter lembrancinha é ter uma festa pela metade. O cúmulo, para mim, foi ir à festa de aniversário da escola dos meus filhos e a Lalinha, com 3 anos, sair chorando porque na festa não tinha lembrancinha! Ela estava com sono, mas não vou justificar seu desejo no cansaço. Numa outra festa, esta de 70 anos de um tio, as crianças perguntaram da lembrancinha, e o aniversariante, como bom avô, foi atrás de providencia-las. Foi muito legal, mas começo a questionar qual é o valor que a gente passa para os filhos quando se faz uma festa de aniversário, que em tese é para comemorar mais um ano de vida, de conquistas e aprendizados, e o que é mais esperado é o que vai ser dado e não o que vai ser trocado. A lembrança tem sido depositada numa parafernália de guloseimas cheias de açúcar (que em casa vão quase todas para o lixo!) e badulaques que quebram no mesmo dia de uso (com raras exceções que não merecem crédito no momento), e não naquilo que deveria ser a essência da festa de aniversário: o compartilhar. Ela é reflexo da cultura do consumo, do ter que levar alguma coisa concreta para casa, quase sempre industrializada.

Já fiz festa de aniversário dos meus filhos com e sem lembrancinha. Já vi lembrancinhas mais surpreendentes em criatividade e custo do que muitos presentes dados ao aniversariante. De todas as lembrancinhas que vi, as únicas que fazem sentido, são as que são criadas na festa, no meio à brincadeira. Se levar um pedaço da festa é importante para as crianças, que cada um leve seu pratinho com bolo, brigadeiro e salgadinho para comer no café da manhã do dia seguinte, lembrando quão boa estava a festa. É uma lembrança que não enche barriga, enche o coração com a ideia do compartilhar o que foi bom.

Olhando para a geração dos meus filhos, que querem, querem e querem, sem saber por que querem e o que querem, não posso cair mais na ideia de que a lembrancinha é um agradecimento pela presença. Lembrancinha foi instituída por um mercado, e como todo mercado, tem uma força difícil de ser driblada, mas não proibida de ser questionada. Acho que todo mundo devia, antes de pensar na lembrancinha, pensar no sentido da celebração do aniversário. Seria uma lembrancinha tão boa para o mundo...

20 de setembro de 2011

Doces avôs e avós

Hoje o RoRo e a Lalinha foram ao clube com meu sogro. Achei que não precisava de mochila com troca de roupa; iam brincar no parquinho. Duas crianças já são o bastante para tomar conta, quem dirá mais uma mochila! Saíram de casa felizes e voltaram mais ainda.

"Tô pelaaada", disse a Lalinha. E estava só de camiseta. Não tinha escapado xixi. Tinha entrado na piscina de short e depois não quis ficar molhada, claro. Nunca imaginei que ela fosse querer nadar, afinal, piscina não é seu forte. O avô improvisou uma saia de toalha, que serviu para acompanhá-la do clube até em casa.

Mas ela não estava só "pelaaada". Da sua boca exalava um cheiro de tuti-fruti daqueles... O avô, como todo avô que se preze, atendeu ao seu pedido de comprar-lhe "chiqueti". Doce avô...

Por causa de doces, já briguei muito com minha mãe, sócia com meu pai de um armário que mais parece uma bomboniere. Desisti de brigar, e quando vamos na casa deles meus filhos podem comer o que quiserem e quanto quiserem. Se o estoque está baixo, vão com meu pai na loja de chocolate, onde cada um tem o direito de escolher o que quiser. Que delícia!

Em casa doce é contido. Guloseimas de lembrancinha de aniversário quase sempre ganham asas e voam... Mas quem sou eu para proibir as pequenas transgressões cometidas pelos avós? Minhas melhores lembranças dos meus são das pequenas coisas que em casa eram proibidas, como fazer vitamina com fruta de verdade no liquidificador de brinquedo, usar esmalte pink, comer sacos de bala e até passar trote em casa de paquera meu para saber se ele estava na cidade (sim, minha avó paterna fez isso... não existia bina!). Avô (e avó) foram feitos para mostrar para os netos o que os pais não podem mostrar (mesmo que adorem!). E isso, explica a pergunta que o RoRo já me fez algumas vezes: "Por que na casa da vovó Carmen tem porcaria e em casa não?". Porque, eu respondi, a casa da vovó Carmen é casa de avó e a nossa não. Bom ter avôs e avós!

14 de setembro de 2011

Quer que o filho coma, coma também!

Tenho refletido bastante sobre o tema alimentação infantil e, mais recentemente, lido sobre a influência negativa da publicidade sobre comportamentos e escolhas alimentares pelo público infantil. Sei que o marketing pesa muito na decisão da compra, mas ainda acho que a propaganda de maior força é a que é exibida dentro de casa.

Tive a sorte de nascer em "berço verde" e com cozinheiras que deixavam qualquer um com água na boca. Minha mãe herdou do seu pai o gosto pelo cultivo de hortaliças e nossa casa sempre foi cercada de uma bela e invejável horta. Cresci com minha mãe cavoucando canteiros nos finais de semana, semeando, transplantando mudas e colhendo diferentes tipos de verduras e legumes. Tipos exóticos e raros só não compunham sua horta quando o clima quente da cidade não os permitiam vingar. Nossa mesa sempre foi farta de verdes, amarelos, vermelhos, roxos... com aromas e sabores de pratos preparados com o mesmo carinho, criatividade e capricho ensinados pela minha avó materna.

Na adolescência eu já percebia que a comida em casa era diferente da comida de algumas casas. Refrigerante só tinha em aniversário de criança (ou seja, duas vezes ao ano); enlatado, só azeite, sardinha e atum. Molho de tomate, milho e ervilha, eram todos frescos. Fui comer o primeiro molho de tomate em lata depois dos 20 anos, numa viagem com amigos, e confesso que comi com certa repulsa.

A grande diferença entre o consumo de alimentos da minha família e de outras, entretanto, eu comecei a perceber para valer quando morei nos EUA. Era a primeira vez que eu preparava todas as refeições diariamente em casa. Portanto, eu fazia compras de alimentos em variedade e quantidade que eu não fazia no Brasil. Nos supermercados eu observava que meu carrinho era muito diferente dos demais carrinhos porque eu carregava litros de leite e suco no lugar dos refrigerantes, e uma variedade de frutas, legumes e verduras em substituição aos pães brancos e salgadinhos de todos os tipos que enchiam a maioria dos carrinhos de família.

De volta ao Brasil, ainda observo que meu carrinho continua sendo diferente da média dos carrinhos que circulam pelos supermercados que frequento - de atacado e hipermercado a lojas gourmet. Ele é mais colorido, não pelas embalagens, mas pela variedade de alimentos.

Em paralelo aos carrinhos de supermercado, entrei para o universo das papinhas e comidinhas com o nascimento dos meus filhos. Comecei a ver e ouvir coisas bizarras sobre alimentação infantil: gente que comprava caixa fechada de papinha industrializada porque nunca cozinhou uma cenourinha com batata para o filho (as duas únicas vezes que dei papinha processada para o RoRo ele regurgitou), mãe que fazia a dieta amarela para o bebê (só oferecia alimentos amarelos nos primeiros meses de alimentação sólida - batata, mandioquinha, mandioca - carboidrato, carboidrato, carboidrato), gente que dizia que carne "pesava" na papinha e tinha medo de o filho passar mal, babá que dava papinha (comida amassada!) para criança com dois anos de idade e todos os dentes na boca, avó que dava comida (a refeição!) dentro do elevador para a criança poder comer, mãe que dava pão molhado no leite para bebê ganhar peso, e muito mais...

Chocada com estes absurdos, eu questionava por quê em casa era diferente. Meus filhos comiam bem, de tudo e no cadeirão. Estão crescendo e continuam tendo uma dieta saudável e equilibrada, comendo sentados à mesa, sem TV, aviãozinho ou similares. Até hoje, com 5 e 3 anos, nunca tiveram diarreia e tomaram antibiótico 2 ou 3 vezes cada um. Não acho que esta saúde toda seja só contribuição genética. Acredito que a herança "verde" tem uma contribuição enorme na qualidade da alimentação das crianças, mas também não é tudo. A orientação recebida pelo nosso pediatra foi essencial para criarmos cardápios variados e estabelecermos regras de bom comportamento durante as refeições. Talvez, sem esta orientação, nossa história fosse um pouco diferente.

Como nosso pediatra, acredito que a educação alimentar começa na amamentação. O bebê deve mamar para se alimentar. Carinho, afeto, aconchego vem junto, da mesma maneira que em uma refeição gostosa em uma mesa. Acontece que, ao meu ver, desde muito cedo, o que deve ou não ser permitido na alimentação de uma criança não é claro para os pais, seja do ponto de vista nutricional, comportamental ou afetivo (aí pode-se pensar que o bombardeio das propagandas acerta em cheio o alvo de quem não está bem orientado e, portanto, vulnerável, não consegue bancar o que a criança pode ou não). Para mim não foi difícil implantar a rotina alimentar porque tínhamos muito bem definido o que podia ou não na hora das refeições e o que cada refeição tinha que conter (guardo até hoje o "receituário" dos meus dois filhos com estas informações). Meus filhos surpreendem muita gente grande porque comem alimentos de todos os grupos alimentares e sem nenhum recurso além de mesa, cadeira, prato e talheres. Simples assim.

Como mãe, eu diria que todos os deslizes de uma criança de não se alimentar bem acontece pela falta de pulso firme de quem cuida dela. Todos os dias, mesmo tendo instalado uma rotina alimentar, é necessário acompanhá-la e isto dá um trabalho tremendo. O mesmo trabalho de preparar uma refeição.

Em tempos de fast food, simplificação da vida, sobrecarga de tarefas, a opção é o caminho mais fácil e curto (isto é o que os alimentos anunciados nas propagandas melhor sabem oferecer). Uma mãe que chega cansada em casa e encontra o filho chorando por manha, precisa de muita força de vontade para dizer não para um chocolate antes do jantar ou a substituição dele por uma pacote de bolacha.

Tenho visto muitas crianças que se alimentam muito mal e que não o fazem por questões financeiras (acredito que muita criança se alimenta mal porque comida neste país tem preço de ouro - aliás, imposto sobre alimentos saudáveis não deveria existir para poder se ter uma população saudável). A primeira pergunta que me faço é se seus pais têm uma dieta saudável e equilibrada. A segunda é quantas vezes cada alimento que não é ingerido foi oferecido à criança.

Meu filho não come peixe. Até um ano o pediatra o proibiu por ser um alimento altamente alergênico. Ofereci peixe ao RoRo algumas vezes e como ele não comia, ou comia muito pouco, passei a oferecer apenas carne. E para diminuir a bagunça na cozinha eu também diminui meu consumo de peixe. Grande erro, corrigido depois que a Lalinha fez um ano. Todos em casa comiam peixe e gostavam, menos o RoRo. Mudamos a estratégia: em dia de peixe não tem carne. Ele continua sem comer peixe como gostaríamos, mas todas as vezes precisa experimentar um pedacinho, mesmo que cuspa por não conseguir engolir (muitas vezes ele tem ânsia de vômito). E assim vamos todas as semanas. A Lalinha não come tomate cru, mas come molho, come tomate como tempero em carnes e outras comidas. Sempre que tem salada de tomate em casa, tentamos colocar um tomate, rodela ou pedaço em seu prato. Algumas vezes ela o come; outras, ela o recusa colocando-o fora do prato, mas nunca desistimos.

Criança cria manias e nós adultos caímos facilmente em suas armadilhas. Um dia resolve que não quer arroz integral porque só gosta de branco e a família nunca mais o cozinha porque a pequena criança não pode ficar sem comer. Pode sim. Meu pediatra assinou embaixo que se meus filhos não quisessem comer que eu os deixasse sem comida, mas não fizesse substituições porque uma hora teriam fome e comeriam. Outro dia fiz panqueca de frango e o RoRo disse que não gostava. Respondi que só tinha aquela comida que estava na mesa, se quisesse, que comesse, caso contrário não teria outra. Resultado, comeu toda a panqueca e no final disse que tinha gostado.

Criança aprende por imitação. Se a família não come o que é saudável é hora de os pais começarem a fazer um esforço se realmente querem o melhor para os filhos. Sempre tive muito medo de cachorro e meus filhos também têm. Tive que começar, marmanjona, a passar a mão em cachorrinhos para eles poderem ver que mesmo sem gostar de cachorros consigo conviver com eles. Como a criança não vai querer comer chocolate se a mãe é chocólatra? Como não vai querer beber refrigerante se o pai o toma no lugar da água? Como dizer não para a bolacha recheada no supermercado se os pais compram pacotes e mais pacotes de porcarias para se entupirem no fim de semana? Posso ser radical, mas sou da opinião de que filho não é para qualquer um. Se a arte e ser pai e mãe é aprender a ser melhor a cada dia superando nossas dificuldades e fraquezas para criar pessoas melhores do que nós mesmos, como criar um filho sem rever seus valores, atitudes e comportamentos, incluindo os alimentares?

O apelo das propagandas está em todos os lugares e fica difícil se ver livre dela. Eu não acho que ela deva ser proibida porque penso que é tarefa dos pais selecionar o que é bom ou não para os filhos. Em se tratando de alimento, é a mesma coisa. Talvez a grande diferença é que os pais também sejam fisgados por elas, justamente porque não têm uma rotina alimentar saudável. Cabe a eles buscarem orientação para começar a mudar seus próprios hábitos, se realmente esperam que seus filhos comam um pouco de tudo que é saudável.

12 de setembro de 2011

Vale a pena um passeio com as crianças pelo centro de São Paulo

Destino: Mercado Municipal e Estação Catavento
Transporte: carro, metrô e muita sola de sapato!

Saímos de casa felizes. RoRo e Lalinha porque andariam de metrô, linha nova e com baldeação na Sé, a maior estação da cidade. André e eu porque depois de quase 6 anos comeríamos os deliciosos pastel de bacalhau e sanduiche de mortedela.

Sábado de manhã, 10:30, céu nublado. Estação Marechal Deodoro. Muitas escadas rolantes para a Lalinha aprender a "pular". Assento livre na janela. Rostinhos de alegria. Estação da Sé cheia, mas de fácil trânsito. Mãos segurando firme nas mãozinhas. Trecho em pé até a Estação São Bento, lotada como sempre. Olhares atentos a tudo. Tudo é bacana, diferente e novo. Evitamos a saída pela Ladeira Porto Geral, mas ela era inevitável no nosso caminho. Loucura? Sempre achei que sim, mas não neste dia.

Lalinha de cavalinho no ombro do pai e eu grudada no RoRo. Assim descemos a famosa ladeira observando as vitrines de fantasia para o Halloween. Um tanto assustadoras, não quiseram entrar para conhecer aquele mundo de parafernálias que transforma sonhos e realiza desejos. Paramos por instantes para assistir ao "Teatro da Bruxa", apresentação de um boneco medonho em frente a uma das lojas. Um mar de gente. Lalinha vendo tudo de cima. RoRo tampando o nariz para evitar o fedor de urina que exalava do chão.

Um pouco pelas calçadas, um pouco pela rua, chegamos rapidamente na Rua da Cantareira. Fila de carro dobrando quarteirão para tentar entrar no estacionamento do Mercadão. Certeza de que tínhamos feito a escolha certa, mesmo enfrentando a multidão da Rua 25 de Março. RoRo brincava de subir e descer as escadas que encontrava pelo caminho.

Entramos no Mercado pelas bancas que vendem no atacado, parte delas fechadas. Encontramos certa resistência das crianças no começo, que queriam ir direto ao pastel. A ansiedade foi temporariamente contornada com a degustação de um pacotinho de castanhas de lua (caju) compradas em uma das bancas. Por um breve período percorremos alguns corredores, até sermos vencidos pela insistência de quererem o pastel. Era a primeira vez que iriam almoçar pastel!

No pavimento superior mesas lotadas, fila no famoso Hocca. Sentei-me com a Lalinha enquanto RoRo e André enfrentavam a fila do caixa para fazer nosso pedido. Quando veio o tão esperado sanduíche de mortadela com provolone e mostarda (o primeiro "prato" a ser liberado) ficamos admirando o ataque e os olhinhos brilhantes de hummmm. Cada criança ficou com uma metade e nós, para variar, comemos o que sobrou, frio, mas ainda delicioso (afinal, 2 sanduiches + pastel, é muita coisa!). O sanduíche só foi deixado de lado quando o pastel de queijo ficou pronto. A sobremesa foi amêndoas cobertas com chocolate, compradas na segunda parte do tour, cujo ponto alto foram os pés e orelhas de porco expostos nas geladeiras dos açougues.

Saímos de um lugar totalmente democrático, com sotaques e caras de todo o país para outro que evitamos diariamente. Os arredores sujos e cheio de mendigos não impediram a Lalinha de correr atrás das pombas, nem o RoRo de ver o córrego (ou rio?) que passa por ali, mesmo que para isso tenham tido que se infiltrar no meio das trouxas dos moradores de rua. Meu espanto foi grande ao perceber que em todo o trajeto a pé até a Estação Catavento, no Palácio das Indústrias, as crianças encararam a sujeira das calçadas e seus moradores simplesmente como parte do cenário. Não houve em nenhum momento estranheza por parte deles. A estranheza estava em mim, que reagia tentando proteger corporalmente as crianças toda vez que um medingo passava do nosso lado, como se eles fossem uma ameaça (e de fato são, uma ameaça ao nosso mundinho protegido, que mostra o que não queremos ver - em nós mesmos). As crianças estavam certas, eles fazem parte do cenário, não estão nem aí para a gente. Eu experimentava pela primeira vez andar em um local desconhecido, feio e sujo achando uma delícia! Estava realmente divertido andar por um pedaço da cidade que raramente vamos, ou, quando vamos, vamos protegidos pelo carro e nossos escudos emocionais que nos impedem de ver e viver a cidade como ela é.

A Estação Catavento dispensa comentários. As crianças adoram passear lá. É ampla, diversa e tem atrativos para todas as idades - nem que o atrativo seja apertar algum botão!

Rumo de volta para casa, mais uma caminhada até a Estação Dom Pedro do metrô. Lugar ermo, com viadutos e término de calçada que nos obriga a atravessar a rua de um lado a outro. Nem bares abertos há. E as crianças iam alegres porque conheceriam mais um novo metrô, tinham comido pastel e sanduíche no almoço, subido nos trens, brincado com as bolhas de sabão e corrido muito na Estação Catavento. Estávamos exaustos. Metrô lotado e um ataque da Lalinha no chão do vagão. Ela queria apenas uma janela para ver o que tinha lá fora do trem... (Precisamos ainda de muitos outros passeios pela cidade para ela entender que às vezes o metrô está lotado e a única coisa que se vê é a perna das pessoas).

As 7 da noite os dois dormiam gostoso. Dia diferente, cheio de novidade. Dia em que eu fui surpreendida pelo quanto a gente vai nos enchendo de armaduras que nos impedem de ver e viver a cidade (e a vida) como ela. E o que é pior, o quanto armamos nossos filhos fazendo com que eles percam essa coisa gostosa chamada liberdade - que a infância sabe muito bem o que é.

26 de agosto de 2011

Arrebenta pipoca, Maria Sororoca!

O RoRo e a Lalinha decidiram que queriam pipoca para nosso piquenique. Mas não qualquer uma...

"Quero pipoca sem caroço", disse a Lalinha. Tentei, mas pipoca que estoura todinha sem ficar nenhum piruá, só as da Tia Tila... Saudade delas!

5 de agosto de 2011

Lobo Mau

Fazia algumas noites que a Lalinha acordava e ia para o meu quarto. No começo achei que fosse manha. Todas as vezes que eu voltava com ela para sua cama, passava um tempo e ela voltava para a minha. Ela chorava, reclamava, e eu, sonada, só pensava no movimento automático de devolvê-la à sua cama. Algumas vezes, extremamente cansada, deixava-a dormir entre mim e meu marido porque eu precisava de uma noite bem dormida.

Numa das noites resolvi perguntar o que acontecia, pergunta que eu devia ter feito desde o início (a pergunta é a coisa mais básica para tentar entender uma situação!). Ela me respondeu que tinha um lobo no seu quarto. Parti para o óbvio, dizendo que lobos não existem nos quartos das crianças, que ela podia dormir. Mas ela voltava a acordar e o ritual se repetia. Para ela o lobo continuava a existir.

Por uma razão que não tem a ver com esta história, alguém comentou comigo sobre o livro Chapeuzinhos Coloridos, de José Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta. Comprei o livro, li as histórias e, numa das noites, depois de tantas coisas que acontecem com os lobos das histórias das Chapeuzinhos Coloridos (vale muito à pena a leitura), tive uma idéia genial (sim, livros infantis são nossos melhores conselheiros porque usam a linguagem da criança!). Enquanto eu levava a Lalinha de volta para sua cama, disse-lhe: "Vamos falar para o lobo ir embora!". Ela topou e juntas falamos firmes: "Vai lobo, deixa a Lalinha dormir tranquila.".

Precisamos de três noites e o lobo mau partiu de vez do seu quarto - e o livro virou uma de nossas leituras prediletas. Logo mais vamos escrever a história do Lobo Mau da Chapeuzinho Rosa, que os autores deixaram para as crianças criarem...

Fantasminha do crescimento

Ontem o RoRo mordeu um palmito e gritou: "Ai meu dente!". Disse que machucou, mas não vi nada diferente. À noite, ao escovar seus dentes, percebi que o tal dente estava mole. Como um palmito podia ser tão maldoso assim?

É, mas o palmito não foi o vilão. Ele só mostrou que aquele incisivo está querendo cair...

Quanto temor começou a rondar sua cabecinha: "E se eu engolir o dente?", "E se cair na escola?", "Vai doer?", "E se cair e eu estiver dormindo?". Perguntas temperadas por lágrimas assustadas e curiosas que me fizeram lembrar da minha primeira mesntruação. Diferente de gerações anteriores à minha que foram pegas de surpresa, eu sabia o que era, que meu dia ia chegar, mas lembro-me com clareza do quanto chorei. Eu tinha completado 13 anos, mas chorava porque eu não queria aquilo para mim. Eu ainda brincava de boneca, era uma criançona. Não queria crescer, mas a maturidade batia na porta.

Com o RoRo vejo o mesmo filminho. Ele, com 5 anos e 2 meses, chora pelo temor de perder os dentes, pelo temor do novo. Pela primeira vez pensei o crescimento pela ótica do desconhecido. Crescer significa enfrentar o que não se conhece: a vida sem chupeta, sem mamadeira, sem fralda, sem grade na cama, sem os dentes!

Minha sobrinha foi das últimas amiguinhas a perder o primeiro dente e torcia para este dia chegar. O novo era um troféu. Já com o RoRo (e mesmo comigo - tal mãe, tal filho!), o novo é um fantasminha que assusta. A fadinha do dente vai ter que ser generosa para mostrar que crescer faz parte da vida...

22 de julho de 2011

Novo nome para cocô mole

Minha sobrinha Kika, 3 anos, atacou o armário de guloseimas na casa da avó. Resultado: contou para o pai que estava com "dordirréia"! No dia seguinte disse que não ia comer nada do armário. Teve dor de ser ré da sua própria extravagância...

16 de junho de 2011

Superlativos

O RoRo entrou na fase do super-mega-hiper, conforme ele mesmo descreve algumas coisas. E para dizer que algo é tudo isso sem usar estas 3 palavras grudadinhas, grande vira grandice.

Alto - altice
Feio - feiice
Gigante - gigantice
Doce - docice
Forte - fortice
Aperto - apertice
E por aí vai... Haja ice!

21 de maio de 2011

Barulho que sai da boca

Achei que fosse um arroto, mas quis ter certeza para ensinar e garantir que a Lalinha pedisse desculpa.

- Lalinha, que barulho foi esse?

- Foi pum que saiu da minha boca.

Ela aprendeu que o pum que sai pela boca chama-se arroto, e que depois dele, tem sempre que pedir desculpa.

6 de abril de 2011

Peneirando sal?

Enquanto a moça que trabalha em casa passava a ricota na peneira para soltá-la, a Lalinha fala: "Sílva, tem muito sal". Sem entender, a Sílvia pergunta "Que sal?". E a Lalinha responde: "Muito sal, não pode muito sal... Tá caindo muito sal".

Ricota, sal... são brancos, são de comer. Como nas brincadeiras de casinha, que uma coisa vira outra com um simples toque de imaginação.

Trocadilho da ervilha

O RoRo tem tomado banho sozinho. Às vezes eu o pego para uma faxina, ou, quando o banho ocorre com a Lalinha, dividimos as partes que eu reviso das que ele se lava sem checagem materna.

Hoje ele fala: "Já lavei a ervilha do pipi". "O quê?", perguntei sem entender nada. Como resposta, ouvi a mesma frase.

"Onde fica a ervilha do pipi?", repeti a pergunta. "Aqui.", apontando para a virília.

Por um momento virília  foi confundida com ervilha!

18 de março de 2011

É bom ser criança...



Frase e desenho do RoRo, claro!
... porque criança pode ir em banheiro de homem e de mulher!

17 de março de 2011

Explicando a morte para uma criança

Estávamos no carro, o RoRo com uns 3 anos e meio, quando ele perguntou se a tia Bia não tinha pai. Respondi que sim, mas que ele tinha morrido há alguns anos. Surgiu, então, a questão: "O que é morrer?". E a resposta mais óbvia do mundo: "Morrer é deixar de viver, é não estar mais vivo."

- "Eu estou vivo?"

- "Está."

- "Você está viva?"

- "Estou."

- "O papai está vivo?"

- "Está."

Na relação de pessoas vivas veio a família toda e alguns amigos.

Por semanas ele repetiu as mesmas perguntas, transformando num inquérito a brincadeira de vivo ou morto.
Do vivo-morto começaram a surgir outras perguntas: "Como morre?". "Você vai morrer?". "Quando você vai morrer?". Para cada pergunta uma resposta simples e sempre a mesma:

    Como morre? - Antes mesmo da minha resposta, o RoRo apresentava a dele com dramatizações e mais interrogações: Deitado? Dormindo? Sentado? Vida e morte ainda estavam muito coladas à brincadeira do vivo-morto, saindo pela primeira vez da vivência corporal para a intelectual. A minha resposta: "Quando o coração pára de bater, quando a pessoa não consegue mais respirar, quando a pessoa está muito velhinha..."

    Você vai morrer? - "Todos nós vamos. Tudo o que tem vida morre um dia, as plantas, as flores, as pessoas."

    Quando você vai morrer? - "Isso ninguém sabe, não dá para responder."
Das conversas que surgiram fomos incluindo as pessoas da família que já tinham morrido, contando seus nomes, suas histórias. Suas perguntas se costuravam num zig-zag de conteúdos assimilados e novas questões que incrementavam o tema.

- "Para onde vão as pessoas que morrem?"

- "Vão para onde as pessoas que morrem vão."

Esta resposta se sustentou por muito tempo, o que me deixava bastante tranquila. Como não somos religiosos, Deus ainda não tinha entrado em nossas conversas (bem como ainda não entrou). Introduzir a tão comum ideia de Céu me incomodava por me fazer lembrar de um primo, que na ocasião do luto pela morte do meu avô, perguntava à mãe se não era possível colocar vários prédios, um sobre o outro, para conseguir alcançá-lo no Céu. Honestamente, não queria correr o risco de me enroscar na engenharia.

Pelos meus percursos religiosos entre o Catolicismo, o Protestantismo e o Espiritismo, e pelas perdas de pessoas muito queridas na minha adolescência, construi  para mim mesma a ideia de que depois da morte todo mundo se encontra e fica melhor do que estava antes (meu único consolo para achar que essa coisa  tenha um pouco de vantagem, para quem vai e para quem fica). Essa ideia já tinha sido passada para minha sobrinha, que se satisfez com a resposta. Então, não tinha por que eu fazer diferente com meu próprio filho.

Pois bem, tudo muito didático, transparente e compreensível - todo mundo nasce, todo mundo morre (aliás, nascer e morrer são questionamentos que caminham juntos nesta idade) - mas só até a morte estar relacionada a pessoas que o RoRo  tinha tido um convívio mínimo ou não conhecera.

Desde que nasceu, o RoRo teve 3 avós, as 2 biológicas e a Titila, a tia avó, irmã da minha mãe, que ocupou o terceiro posto. Nossa convivência era quase diária, uma companheirona dele e minha (mais tarde, da Lalinha também) nos momentos mais alegres e nos mais difíceis. O ano passado inteiro, contudo, foi um ano de intensa luta contra metásteses que se instalaram em seu corpo. O RoRo acompanhou sua história, as marcas na pele para a radioterapia (desenho com canetinha!), a queda do cabelo (e entender que o papai toma remédio para não cair cabelo e a Titila tomava um que fazia o cabelo cair!), a combinação dos turbantes com as roupas, sua dificuldade em encontrar posição que minimizasse suas dores, seu afastamento da nossa casa (não caminhava a pé nos 2 quarteirões que nos separavam), as tardes em que não nos encontrávamos porque ela estava em algum médico ou reclusa em recuperação da quimioterapia... Mais tarde, a boa notícia de que as "manchinhas" tinham sumido, a visita dela na nossa casa nova, a preparação para sua festa de 74 anos organizada por ele e por mim e, infelizmente, a triste realidade de que "as manchinhas tinham voltado e desta vez não tinha remédio que pudesse tirá-las do seu corpo". Uma semana depois da festa com bolo, brigadeiro e bexiga, Titila internou e não saiu mais.

Todos os dias o RoRo perguntava como ela estava, se havia melhorado, até que um dia, depois de quase um mês e meio internada, minha mãe avisa que seus sinais vitais estavam muito fracos e que só nos restava esperar o corpo parar de pulsar. Preparei tudo em casa e, antes de sair, falei ao RoRo, Lalinha e minhas sobrinhas, também com 2 anos e 8 meses: "Estou indo para o hospital porque a Titila está muito fraquinha e não tem nenhum remédio que possa fazê-la melhorar. Ela vai morrer.".

Eu precisava dizer isso para eles, principalmente ao RoRo porque eu sabia que eu não voltaria tão cedo para casa e eu queria que ele ouvisse de mim essas palavras. E de fato foi o que aconteceu.

Por telefone orientei todos sobre o que já tínhamos conversado sobre a morte e o que eu achava que podia ser dito. Em vão...

Nosso encontro no dia seguinte, depois do enterro, foi uma avalanche de emoções, perguntas e surpresa de conteúdos que não saíram das nossas inúmeras conversas sobre vida e morte. Todo o cuidado que eu imaginava ter tido em "prepará-lo" para o tema parecia ter ido por água abaixo.

Com 4 anos e meio, as perguntas sobre morte foram ficando cada vez mais refinadas com novos conteúdos apresentados por quem esteve com ele na minha ausência. Não consegui abraçar meu filho sem chorar. Minhas lágrimas eram minha tristeza, mas também um alvará para que ele pudesse expressar o que estava sentindo. Choramos juntos por mais de uma hora. O RoRo estava desolado por não ter ido se despedir da tia (nunca achei que velório e cemitério fossem lugar para criança) e ansioso para ter resposta a tantas perguntas que pareciam sair de um saquinho de sorteio, num ir e vir sem fim:

- "A Titila já virou pó?"

- "Onde ela morreu?"

- "Quem colocou a Titila na caixa (caixão)?"

- "Como enterra?"

- "Como ela foi colocada na caixa?"

Entre cada pergunta, meu espanto, decepção e um pouco de desespero de como eu iria sair daquela situação. Quem lhe dissera essas coisas? Não adiantava eu procurar o "culpado". Dei-me conta, com a morte, que as coisas da vida chegam às crianças por mais que a gente tente protegê-las. O RoRo tinha fragmentos assustadores de um enterro, e eu, uma situação que parecia não ter saída. Cheguei até a esboçar um discurso sobre corpo e alma! Uma catástrofe.

Sem saber qual caminho trilhar, recorri à minha grande amiga, que me sugeriu falar que minha tia tinha virado uma estrelinha no Céu. Mais tranquilia por ter dividido minha angústia, eu tinha dúvidas se devia falar desta maneira. Além do mundo novo que o RoRo questionava, eu ainda teria que apresentar o Céu? Mas como, se minha tia estava numa caixa embaixo da terra...

Telefonei para outra grande amiga, minha fada, que sugeriu que eu dissesse que onde minha tia estava tinha uma escada para o Céu, que só ela podia ver. Escada? Não!

Minha cabeça girava, meu filho chorava. Eu chorava junto, de tristeza, de impotência. Tudo o que ele ouvira era concreto demais, doloroso e difícil de entender sem ver. Numa idade em que fantasia e realidade caminham juntas, acabei me rendendo ao Céu. Não tinha pensado antes que ele é mágico, misterioso, grande, bonito, infinito. Quem nunca quis tocá-lo ou andar de avião para ficar bem pertinho dele? É muito melhor do que a caixa, a terra, que sufocam e apertam. Por que eu não tinha me rendido a essa ideia antes?

Remendando de um lado a outro eu disse algo assim: "A Titila não vai ficar morando na caixa. Ela só entrou na caixa para poder pegar uma passagem secreta para o Céu. Ela vai morar lá, onde já moram as pessoas que morreram e que ela gostava muito. Vai encontrar todo mundo e ficar feliz, sem dor". Claro que o RoRo me perguntou como era essa passagem, e eu respondi que não sabia porque a gente precisava morrer para saber. Ficamos calmos.

Os dias seguintes foram recheados de perguntas, mas havia um conteúdo mais lúdico. O RoRo contou para a Lalinha que a Titila agora morava no Céu e, depois de um silêncio, os vi no terraço do nosso apartamento no 11° andar chamando pela tia e abanando a mão. Eles se divertiam, como sempre acontecia na sua presença.

Dois meses se passaram de sua morte e o RoRo ainda fala da Titila, quase todos os dias. Chora porque tem saudades, lembra do que ela fazia, usa o que ela deu, brinca com os imãs de geladeira que ficaram de herança para ele e a Lalinha... Lembra da tia com carinho e saudades, e, o que acho mais importante, elabora o luto. Já disse que queria morrer em Tatuí (onde minha tia foi enterrada) para ficar no Céu daquela cidade (me confirmou que para poder ficar perto dela) e que queria morrer antes de todo mundo (incrível que percebeu que quem morre primeiro não sofre pela morte dos que se vão depois). O RoRo fala sobre morte, inventa estórias sobre morrer, em casa, na escola, por onde passa. Quem está a sua volta escuta, faz perguntas, fala sobre saudade, tristeza, perdas, mostrando que isso tudo faz parte da vida, como os bons momentos que a gente tem com as coisas e pessoas que a gente gosta muito.

A morte é sempre uma lição, como a vida. Ela surpreende não pelo fim, mas pela percepção daquilo que no dia a dia a gente não se dá conta que existe...

8 de março de 2011

Quem "dirige" o avião?

É o Robôtolo, respondeu a Lalinha.

Neologismo? Dificuldade com as palavras? Ou sabedoria infantil de que a máquina é comandada por robôs + pilotos?

Seja o que for, ela conseguiu com o irmão, num vôo vazio, conhecer a cabine de uma aeronave. Amou, como toda criança!